A reforma trabalhista pode afetar a educação

A  premissa da reforma é gerar um crescimento econômico em todos os setores. Porém, essas mudanças introduzidas na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) podem afetar a educação.

A reforma trabalhista, sancionada em julho de 2017 pelo presidente Michel Temer, passou a valer no dia 11 de novembro do mesmo ano. Segundo o Sindicato dos Professores (SINPRO-SP), após a validação, foram demitidos quase mil docentes na cidade de São Paulo. Entre as instituições estão a Faculdade das Américas (FAM), o Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e o Centro Universitário Estácio de Sá. Na época, alguns professores, alunos e especialistas pedagógicos alegaram que essa ação era prejudicial à educação.

Para o advogado Alex Soares, pós-graduado em direito do trabalho e especialista em direito empresarial, o contrato intermitente, modalidade da nova CLT, pode afetar o acompanhamento educacional. “Com o contrato intermitente os professores não serão mais contratados de forma efetiva, serão chamados quando formar turma. Esse tipo de contrato também possibilita o empregador a ter educadores na faculdade por 20, 10 ou 5 horas no mês. Assim, não terão um vínculo regular com a instituição, nem com alunos. Isso pode prejudicar a orientação educativa”, completa.

Os professores já ganhavam renda mensal calculadas por hora/aula nas antigas normas da CLT. Entretanto, o vigor da reforma permite contratar profissionais por alguns dias da semana com salário por hora, sem compromisso de pagar benefícios e renda mensal.

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Alex Soares dos Santos, pós graduado em direito do trabalho e especialista em direito empresarial pela ESA OAB. Foto: arquivo pessoal.

O advogado ainda diz que alguns pontos da reforma favorecem as empresas: “O banco de horas individual, a alternativa de terceirizar e cooperar, a negociação entre empregado e empregador sem mediação do sindicato e a pejotização em modalidade de contrato, onde o trabalhador presta serviço como pessoa jurídica, tornam a reforma excelente para empregadores mal-intencionados”, afirma.

Sobre as demissões em massa, Alex explica que eram permitidas com mediação do sindicato da categoria. Após a reforma, não tem mais essa exigência. “Algumas faculdades se aproveitaram desse ponto e dispensaram professores. O sindicato entrou com ação para anular a dispensa, mas o Tribunal Superior do Trabalho (TST) declinou. Então, as demissões foram feitas de forma legal”.

O advogado revela que ainda é cedo para responder se o arranjo na CLT pode favorecer o crescimento da educação. “Ainda é prematuro dizer que vai ajudar no crescimento da educação privada, precisamos de um certo tempo. Creio que cerca de três ou quatro anos para ter uma ideia geral sobre os benefícios ou malefícios dessa reforma trabalhista”.

Já para o professor Dr. Alex Criado, demitido da FAM, essa situação mostra como as entidades não estão engajadas em sua missão com a comunidade. As faculdades são empresas privadas que têm o objetivo de passar para a sociedade em formação o conhecimento e formar pensadores.

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Professor Dr. Alex Criado em entrevista à nossa reportagem. Foto: Larissa Carvalho.

No caso do professor Alex, ele sente que todo o trabalho de pesquisa para concluir essa missão é deixado de lado para focar no lucro. “Houve muito trabalho, muita dedicação com o processo pedagógico. E, de repente, tudo é jogado de escanteio para quê? Lucro. É necessário que a gente saiba que não representamos nada dentro da faculdade. Nada além de peça para gerar lucro. Quando não percebemos isso, nessa situação, a gente fica chateado, como eu fiquei”, desabafa.

O professor fala também sobre a possível exclusão da exigência de titulação para se contratar novos docentes. Sem essa condição, as faculdades não são mais obrigadas por lei a contratar um número de mestres e doutores. Isso pode prejudicar o ensino, segundo Alex: “Não posso ter a pretensão de dizer que, depois de minha saída, o processo pedagógico vai rebaixar. Mas podemos ter um desleixo com a educação. Os mestres que acompanhavam os Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) de diversos alunos, foram demitidos. Assim, atrapalha o desenvolvimento didático”, explica.

O educando Ramon Garrido, estudante de Ciências Contábeis, revela como as demissões da FMU o prejudicou. “Depois da demissão, não perdemos somente professores, perdemos novos métodos de pensar e analisar a ciência. Além disso, meu curso foi reduzido em 16 horas, mesmo somando as aulas à distância. Com a carga horária reduzida, a qualidade diminuiu bastante. Eu sinto que houve uma defasagem no ensino. Talvez seja cedo para eu falar, mas a primeira impressão é essa”, conta.

Victor Silva, aluno de biomedicina, na FAM, nos conta como seu curso foi prejudicado.“Essa demissão afetou meu curso de várias maneiras. Perdi a coordenadora do meu curso que nos ajudava e apresentava um modo de pesquisa mais abrangente. Além de reduzir o número de professores mestres, diminuiu muito as aulas presenciais, que agora são apenas as terças e quintas. Eu acredito que a gente aprende muito melhor dentro da sala de aula”.

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Faculdade das Américas. Campus Augusta. Foto: Giovani Souza.

Para outros alunos, o problema maior é o  fim da conexão entre docente e discente: “Deve haver sinergia entre alunos, professores e a faculdade para que a educação seja a peça cardeal para transformar a nossa sociedade. Existe uma relação dentro da sala de aula que incentiva a continuidade de projetos. A partir do aprendizado dessa relação que a gente inicia a missão de partilhar o conhecimento. Um professor que está orientando um TCC, por exemplo, tem uma conexão com o aluno. Isso deve ser respeitado! E não foi”, desabafa Beatriz França, aluna de jornalismo da FAM.

Em tentativa de contato, não obtivemos respostas das faculdades a respeito das demissões e das possíveis mudanças nas grades dos cursos oferecidos. Da mesma maneira, não houve confirmação de adesão da reforma trabalhista por parte das instituições citadas aqui.


Postado por: Douglas Oliveira
Redigido por: Douglas Oliveira
Revisado por: Giovani Souza
Entrevistas por: Giovani Souza, Gislaine Silva, Larissa Carvalho, Larissa Diniz, Lethycia Diniz Mayla Ricci e Sabrina Godoy

 

 

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